Mais seis abutres-pretos integram programa para reforçar a colónia do Douro Internacional

Fotografia: Novo grupo de abutres-pretos em aclimatação no Parque Natural do Douro Internacional. ©LIFE Aegypius Return

 

 

Ingressou na semana passada um novo grupo de seis abutres-pretos (Aegypius monachus) no programa de aclimatação (adaptação faseada) no Douro Internacional, onde está localizada a colónia reprodutora mais frágil do país. Trata-se de uma estratégia de conservação de abutres pioneira em Portugal, implementada no âmbito do projeto LIFE Aegypius Return.

 

Fidelizar abutres-pretos ao território

Em 2024, foi inaugurada a estação de aclimatação de abutres-pretos construída em Fornos, no concelho de Freixo de Espada à Cinta, no âmbito do projeto LIFE Aegypius Return. Esta estação consiste numa jaula de grandes dimensões (18 metros de comprimento, 9 de largura e 6 a 8 metros de altura), localizada junto a um campo de alimentação para aves necrófagas (CAAN). A estrutura permite receber abutres-pretos, durante alguns meses, com todas as condições necessárias à sua segurança e bem-estar. Durante esse período, os abutres-pretos podem observar e interagir com os seus congéneres e outras espécies que estão no exterior, socializando e aprendendo os comportamentos naturais, como a alimentação e a identificação de perigos.

 

O objetivo é que estes abutres se fidelizem ao território do Douro Internacional e acabem por reforçar a colónia reprodutora local, que é a mais frágil do país. A fragilidade deve-se a estar muito isolada – a colónia mais próxima está a mais de 100 km, em Espanha – e por contar com um pequeno número de casais reprodutores.

 

Que abutres fazem aclimatação?

Todos os abutres-pretos que integram o programa de aclimatação são juvenis dos quais não se conhece a colónia de origem, que deram entrada e foram tratados em centros de recuperação de fauna silvestre. As causas de ingresso nesses centros são variáveis, mas a mais frequente é a exaustão e desorientação. Após saírem do ninho, alguns juvenis fazem voos de dispersão muito longos, durante os quais podem não encontrar alimento ou habitat adequado para descansar. São, assim, muitas vezes encontrados à beira-mar, ou em áreas pouco típicas para a sua presença, incluindo zonas urbanas. Assim se explica que, no outono de 2024, tenham sido observados abutres-pretos em Peniche, em Almada, em Loures e no Algarve, por exemplo. Apesar das tentativas, nem sempre é possível resgatar estes abutres. Nesses casos, resta esperar que recuperem energias e consigam sobreviver.

 

Quando os técnicos autorizados ou as autoridades (GNR – Guarda Nacional Republicana e/ou ICNF - Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas) conseguem resgatar estes abutres debilitados, ou mesmo feridos, são entregues em centros de recuperação.  Após a sua reabilitação, a devolução das aves à natureza é atrasada por alguns meses, que passam em adaptação lenta e faseada (aclimatação) no Douro Internacional. Esta libertação retardada é designada por soft release.

 

 

Abutre-preto em recuperação no RIAS. ©RIAS

 

 

 

Seis abutres-pretos em aclimatação

Este ano, são seis os abutres-pretos que integram o programa de aclimatação do projeto LIFE Aegypius Return.

 

Um foi encontrado perto do mar, em Armação de Pêra. Foi entregue pelos Vigilantes da Natureza (ICNF) do Parque Natural da Ria Formosa no RIAS, centro de recuperação gerido pela Associação ALDEIA em Olhão, bastante debilitado e exausto.

 

Outro abutre-preto foi localizado na barragem do Alqueva, quase a afogar-se. Foi transportado para o CARAS - Centro de Acolhimento e Recuperação de Animais Silvestres, gerido pela LPN - Liga para a Protecção da Natureza em Évora, onde recebeu os primeiros socorros e foi estabilizado. Daí foi transferido para os cuidados do CRAS-HVUTAD - Centro de Recuperação de Animais Selvagens do Hospital Veterinário da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, e posteriormente para o CIARA - Centro de Interpretação Ambiental e Recuperação Animal, onde terminou a sua recuperação.

 

Também as equipas do CRAS-HVUTAD e CIARA trataram de um abutre-preto com uma complicada lesão que requereu cirurgia: uma rotura de ligamentos que quase o impedia de voltar a voar. Esta ave deu inicialmente entrada no Centro de Recuperação de Fauna do Parque Biológico de Gaia, onde recebeu os primeiros tratamentos.

 

Um quarto abutre-preto foi resgatado pelas equipas do ICNF na zona da Vidigueira, muito próximo da mais recente colónia da espécie no país, descoberta em junho de 2024. Foi entregue e recuperado no CERAS - Centro de Estudos e Recuperação de Animais Selvagens, gerido pela Quercus, em Castelo Branco.

 

Foi também no CERAS que recuperou outro abutre-preto juvenil debilitado, que foi recolhido em São Facundo, Abrantes, e entregue pelo ICNF de Ponte de Sôr ao CERAS.

 

Finalmente, o sexto abutre a integrar o programa de aclimatação este ano foi encontrado debilitado e desorientado na zona de Cadaval e entregue pelo SEPNA – Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente da GNR, de Alenquer, no CRASM  - Centro de Recuperação de Animais Selvagens de Montejunto, gerido pela Quercus. Posteriormente foi transferido para o CERAS, em Castelo Branco.

 

Após um check-up veterinário final, recolha de biometrias e amostras biológicas, e anilhagem (para permitir a identificação individual), todos estes abutres foram colocados na jaula de aclimatação, e serão cuidadosamente monitorizados por videovigilância, pelas equipas do LIFE Aegypius Return e em particular pela Palombar, a entidade responsável pela gestão do programa de aclimatação do projeto.

 

 

 

 

Check-up veterinário final, recolha de biometrias e amostras biológicas, antes da entrada dos abutres na jaula de aclimatação. ©LIFE Aegypius Return

 

 

A aclimatação funciona?

Em Portugal, esta estratégia de conservação – que recorre a aves selvagens, nascidas na natureza – nunca tinha sido testada em abutres ou grandes rapinas. No entanto, experiências anteriores, realizadas com abutres-pretos noutros países (e.g. Bulgária, França), demonstraram que o soft release é mais eficaz na fixação de indivíduos a um determinado território do que a devolução imediata à natureza, sendo o procedimento recomendado para acelerar o assentamento e aumentar a viabilidade de uma população.

 

Os quatro abutres-pretos que estiveram em aclimatação no Douro Internacional em 2024 são ainda jovens para se reproduzirem. No entanto, desde a sua libertação, três têm permanecido na região do Douro Internacional. Apenas a fêmea Alfavaca se afastou para leste, e está atualmente a cerca de 280 km do Douro Internacional.

 

 

 

Movimentos dos quatro abutres-pretos que estiveram em aclimatação no Douro Internacional em 2024, desde a sua devolução à natureza, em novembro de 2024, até março de 2025. Azul – Azedinha; Verde – Arçã; Vermelho – Almeirão; Lilás – Alfavaca.

 

 

 

 

Este programa de conservação só é possível graças ao trabalho das equipas dos centros de recuperação e à articulação entre as autoridades e todas as entidades envolvidas. A todas as pessoas e entidades, os parceiros do projeto LIFE Aegypius Return expressam o seu agradecimento e o reconhecimento pelo trabalho fundamental desenvolvido.

 

São também devidos agradecimentos a todos os que participaram no evento de transferência do novo grupo de abutres-pretos para a estação de aclimatação, no passado 19 de março. Estiveram presentes os parceiros de projeto Palombar, enquanto anfitriões e gestores do programa de aclimatação; VCF - Vulture Conservation Foundation, enquanto coordenadores do projeto LIFE Aegypius Return; ATN – Associação Transumância e Natureza; SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves; LPN – Liga para a Protecção da Natureza; GNR - Guarda Nacional Republicana - Equipa de Proteção da Natureza e Ambiente (EPNAZE) do Parque Natural do Douro Internacional (PNDI) / Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) do Comando Territorial de Bragança. Agradecemos ainda a presença e hospitalidade da Câmara Municipal de Freixo de Espada à Cinta e da Junta de Freguesia de Fornos e Lagoaça, bem como do ICNF – técnicos e Vigilantes da Natureza da Direção Regional do Norte/PNDI. É, ainda, devido um agradecimento especial às equipas dos centros de recuperação para a fauna pelo cuidado com as aves e apoio na sua transferência: CRAS-HVUTAD, CIARA, CERAS e RIAS.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O projeto LIFE Aegypius Return é cofinanciado pelo programa LIFE da União Europeia. O seu sucesso depende do envolvimento de todos os stakeholders relevantes, e da colaboração dos parceiros, a Vulture Conservation Foundation (VCF), beneficiário coordenador, e os parceiros locais Palombar – Conservação da Natureza e do Património Rural, Herdade da Contenda, Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, Liga para a Protecção da Natureza, Associação Transumância e Natureza, Fundación Naturaleza y Hombre, Guarda Nacional Republicana e Associação Nacional de Proprietários Rurais e Associação Nacional de Proprietários Rurais Gestão Cinegética e Biodiversidade.

 

 

Subscreva a
nossa Newsletter

Se deseja receber informação atualizada sobre a LPN, por favor insira o seu email:

© 2018 Liga para a Protecção da Natureza.

Powered by bluesoft.pt